terça-feira, 27 de novembro de 2012


Passionalidade

Um grupo de teatro paulistano resolveu tratar sobre o tema "família e poder", recorrendo ao teatro grego. De lá para cá, atualizando os fatos para as novas gerações, o ator e a diretora fazem um comentário curioso. Eles dizem que "a passionalidade costuma ser qualidade da juventude, mas na atualização da peça aparece como característica dos mais velhos. Para eles é um reflexo da relações contemporâneas, pois os jovens se relacionam com frieza e distanciamento, estão anestesiados." (peça Átridas, matéria Folha de SP em 27/11/2012)

Tem alguma questão a ser vista neste comentário. A vida está cada vez mais difícil de ser encontrada! Sabe aquela história das crianças que jamais viram galinha, porco, vaca, de verdade? Só no filme, no desenho, no cinema? Os jovens estão se acostumando a viver sem ver a vida! Anestesiado é uma palavra forte, mas muito pertinente neste caso. Que maluquice é esta que faz a pessoa no cinema fotografar a tela e enviar comentário imediato para os amigos, dizendo que está no cinema vendo tal filme? E depois fotografar a comida e enviar dizendo que está em tal restaurante comendo tal comida? Denise Fraga em sua crônica de hoje pensou (de forma crítica) num olho que clicava, uma piscada uma foto. Logo mais chegamos nisto!
Se os jovens anestesiados não sabem mais nada sobre a passionalidade, as mulheres seguem um rumo assustador, negando sua feminilidade. Parto só com dia e hora marcado evitando "aquela coisa tenebrosa que é o trabalho de parto". Desdém pelo útero que tirando a função de abrigar um feto não serve pra mais nada. Desprezo pela menstruação que além de nada higiênica só serve para causar transtornos físicos e emocionais. Esta e outras formas de agressão ao feminino estão em alta e são acolhidas pelas próprias mulheres.

Então Flora-avó, a mulher de cabelos grisalhos e soltos até os ombros em largas ondas rebeldes, daria uma gargalhada larga e longa, colocaria no toca discos um mambo daqueles bem dançantes e sacudiria seus quadris envoltos num tecido florido. Deixaria os lábios abrirem e fecharem balbuciando a letra sensual, porque como árvore mais antiga era também a mais firme, e poderia rir da pequena Flora comendo folhas de alface enquanto um coelho saltava feliz nos arredores do sítio. Porque Flora-avó mora num sítio e não é um velhinha pirada e exótica, destas de filmes americanos meigos. Ela apenas sabe os segredos de estar  no momento. Vc sabia que estão matando os momentos? As horas, o dia, a noite, mas sem momentos!!
Flora-avó é uma pintora que já foi datilógrafa, vendedora do antigo Mappin no centro de São Paulo, depois cozinheira de mão cheia e mãe de dois filhos, viúva, mulher de um só homem embora, na juventude, tivesse tido queda por outro. Flora avó virou árvore de tanto viver a vida e guardar seus momentos numa caixinha de polén dourado. Às vezes chegam visitas de borboletas azuis. Uma retribuição! Passionalidade.
Embaixo de sua sombra Flora-neta busca fôlego, mas sem ver que está na sombra da grande Flora come sua alface apressada porque deve correr mais que a vida. E...zás...já foi....


quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Hoje que não é amanhã


Ontem era Flora, hoje sou eu a procura dela. Amanhã ainda não existe. Flora não tem idade porque terá todas as idades. Flora é daqui e do além, dos mistérios todos, os gozozos e os gloriosos. Flora é deusa e deusas, talvez vestida de nuvem ou coberta de folhas outonais. Flora será minha parceira de escrita, de sonhos e ilusões. Então, assim...Flora.
Frondosa jaqueira, senhora, velha forte e farta como disse o poeta. Flora devorando nossos sonhos, acolhendo nossa fronte suada e a língua sedenta. Um feminino íntegro que ao romper-se nos conduz à origem da vida, um hímen passagem, um portal que perpetua nossa existência.
Conhecem o quadro " A Origem da Vida" de Gustave Corbet? Pesquisem. Deu o que falar este ano ao ser supostamente censurado na apresentação de Jorge Coli na ABL, quando ele discorria sobre conceitos de arte, sexo e pornografia. Sua conferência denominada "O sexo não é mais o que era" estava sendo transmitida ao vivo e teve seu sinal cortado quando o professor, ao exibir o quadro, pronunciou a palavra "boceta". O que nos leva a pensar sobre que formas a capa do preconceito ao feminino hoje se esconde?
Por isto, Flora será também este estado magnífico de satisfação com o próprio sexo. Deitada, sem tensões e livre de julgamentos, exatamente como a modelo que posou para Corbet. O avesso das mulheres alteradas, loucamente depiladas, caminhando feito gado no corredor da morte da beleza. 
Bem, Flora está apresentada. Ela é ampla, geral e irrestrita. Do céu e da terra, ela é lua. E tem histórias para contar. Esta é a próxima etapa. Hoje que não é amanhã.




quarta-feira, 21 de novembro de 2012


Personagem em busca de autora....

Pequeno prólogo
Hoje é uma data significativa em minha vida. Uma boa data para retomar este blog!! Apesar da disposição de escrever com assiduidade, acabei por deixar de lado este veículo de escrita e me dedicar a outros. Especialmente a dramaturgia, minha paixão mais recente.
No entanto, tendo em vista o processo da nova peça chamada " A Fogueira de Eva" e do novo livro em parceria minha amiga Edméia, senti que o blog seria um local interessante para reflexões e ligações entre estas várias facetas que me compõem neste momento.
Foi um compromisso começar nesta data e manter uma constância. A primeira parte já estou cumprindo e a segunda espero dar conta!!

Para Flora, a mulher inventada

Flora não existe! Será meu personagem neste blog, birrenta e teimosa que sou. Porque no teatro contemporâneo os personagens estão em desuso e quando existem não constumam ter nomes. O teatro pós moderno é parceiro da performance, que não tem a mesma pegada de antes também. Transformou-se. Tenho aprendido muita coisa boa com esta nova geração de dramaturgos, seja em cursos ou assistindo espetáculos. Engatinho na dramaturgia, ainda tateando em torno das regras e métodos para depois conseguir me soltar.
Minha primeira peça, "Sangue Seco", foi escrita numa só tacada. Sem nada saber de nada en relação a dramaturgia, escrevi um monólogo de tom confessional e a mulher em cena não tem nome. Sem querer acertei! Pelo menos nisto. No restante é um texto bom e uma dramaturgia de iniciante. Vou modificar.
Minha segunda peça está mais interessante e em processo criativo! São três personagens, três mulheres, e que têm nome! Não foi de birra, mas sim por experimentação. A peça vai falar de mulheres acusadas de bruxaria na São Paulo colonial. É baseada em documentos históricos, fatos reais.
Mas aqui neste blog é birra mesmo. Não sou eu e sou eu. Não é um personagem e é um personagem. Sabe que estas questões assim confusas, sem nexo, também estão em voga? Super "in"!! Bom pra mim, que me sinto confusa a maior parte do tempo. Já me livro de estar aqui pra dar conselhos.....quero mais brincar com as palavras e refletir em círculos amplos. Uma pedrinha caindo na água.
E tem Flora!! Esta mulher-personagem inventada agora e protagonista deste blog que nem é popular. Mas tudo bem, é preciso energia e empenho. Enfim...voltando...Ela, a personagem, vai ser um pouco de cada mulher que me é próxima e terá pitadas de muitas mulheres com as quais convivo ou não. Flora é de dentro e de fora.
Por enquanto, leiam a letra da música  "Flora" do Gilberto Gil.
Amanhã eu começo a falar sobre Flora, apresentar Flora minha personagem. 
Em alguma dimensão Flora vai existir!! Afinal existe ou não existe??  Claro que não existe....mas quem sabe em alguma dimensão...Hum!!! Canseira do ser e não ser...Só sei que amo Hamlet.